Recentemente iniciei minhas peregrinações para cursar um mestrado, distante 1.137 km de minha morada. Como estes deslocamentos se dão por transporte rodoviário, tenho dezoito horas em frente a uma janela, que descortina a verdadeira paisagem do sertão nordestino e abre as portas de meu imaginário para reflexões, lembranças e projetos (quando não estou mergulhado em algum livro, que também me descortina paisagens...).
E, como o grande Luiz Gonzaga já cantava:
"Mas o pobre vê nas estrada
O orvaio beijando as flô
Vê de perto o galo campina
Que quando canta muda de cor
Vai moiando os pés no riacho
Que água fresca, nosso Senhor
Vai oiando coisa a grané",
trago-lhes aqui algumas dessas viagens transformadas em idéias despretensiosas, apenas como um exercício de escrita e registro de minhas elucubrações, "oiando coisa a grané"!
Vem viajar comigo!
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O paradoxo da modernidade
Depois que o dia amanheceu, não consegui continuar dormindo. Abri as cortinas e fiquei admirando a paisagem que passava em minha janela.
Casinhas bucólicas e simples em campos secos (provavelmente cheios de pastagens quando a chuva assim o permite), cabras e cabritos espalhados, um poço (talvez seco), uma cerca velha e sinuosa. Pequenas veredas que torteiam pelo mato ralo, conectando as pessoas, ligando casas e localidades.
Um pouco mais à frente, já chegando à metrópole, casas/barracos à beira de barrancos, sem as comodidades de energia elétrica, água encanada, sistema de esgoto e coisas do gênero.
Fiquei a pensar. Estava chegando a um centro de excelência em tecnologia, laboratórios digitais dos mais modernos, os grandes nomes da ciência da computação no Brasil, enfim, à vanguarda do “conhecimento tecnológico”. E pelo caminho, a miséria e a pobreza que podemos encontrar em qualquer parte deste nosso país...
Quando era criança, assistia a filmes futuristas em que os automóveis eram guiados por computadores, os homens usavam a ponta dos dedos para executar tarefas antes impossíveis e as cidades eram extremamente evoluídas.
Hoje, temos automóveis guiados por computadores que até cegos pilotam e usamos a ponta dos dedos para executar tarefas inimagináveis. Entretanto, as cidades não estão extremamente evoluídas... Não conseguimos (ou queremos) levar o progresso e a tecnologia a todas as pessoas nos mais distantes rincões de nossa “pátria amada, idolatrada, salve salve!” Fome, miséria, desemprego, violência, ignorância e tantos outros males vagam soltos pelos campos e pelas cidades. Qual o meu papel em tudo isso? O que fazer para que aquelas pessoas tenham acesso ao conhecimento que a internet nos proporciona? Como trazê-los até as infinitas possibilidades que o progresso tecnológico nos disponibiliza?
Desci do ônibus com um gosto amargo na boca e na alma...
Não há modernização que não abrace à ganância e à injustiça. Como dizia minha mãe: "Beba toda água do seu copo, ela está ai por que está faltando no copo de alguém."
ResponderExcluirO homem evoluiu muito em tecnologia mas espiritualmente está regredindo. Os senhores do senado tem até tablets, enquanto o povo no sertão só anseia por água.
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